quarta-feira, 17 de abril de 2013

Comentário sobre a conversa filosófica entre Krishna e Arjuna em Bhagavad Gita

Arjuna está diante de seus parentes, situados no lado oposto do campo de batalha. Paralisado, ele ouve os conselhos de Krishna, o Ser Supremo que, na batalha, conduz seu carro. Arjuna não quer, em um primeiro momento, matar seus parentes. Que argumentos Krishna evocará para dissuadi-lo?

Quando a batalha está prestes a ter início, Arjuna pede a Krishna que o carro onde eles estão seja elevado até um ponto intermediário entre os dois lados do campo de batalha (kurus [lado oposto] e pândavas [lado que Arjuna defende]), a fim de que seja possível ver os rostos das pessoas contra as quais ele irá lutar e, provavelmente, matar.

Krishna atende ao pedido de Arjuna e, ao avistar os guerreiros inimigos, ele percebe que ali estão seu pais, irmãos, amigos e mestres. Neste momento, Arjuna demonstra grande aflição e se encontra desmotivado para o combate: "E quando Arjuna viu isso, entristeceu-se no seu nobre coração e, cheio de aflição e dó, proferiu estas palavras: Ó Senhor, vendo eu as faces e os vultos dos parentes que querem lutar uns contra os outros, sinto exaustos de forças meus membros e sem sangue meu coração.". Ainda, Arjuna deixa claro que seus parentes o querem morto e, caso ele vença a batalha, sua recompensa será grandiosa: "…não quero matá-los, embora eles tenham sede do meu Sangue! Embora, com isso, obtivesse o reino dos três mundos."
Arjuna em seu carro guiado por Krishna entre Kurus e Pândavas
Aqui, é interessante observar as metáforas associadas a alguns elementos presentes. A área intermediária do campo de batalha, onde Krishna leva o carro de Arjuna, é interpretada como Antaskârana: A "ponte" ou "caminho" entre a parte terrena e divina da mente. Assim, podemos atribuir os Kurus (liderados por Brishma, que representa o egoísmo e a obstinação) à parte terrena, e os Pândava (que obedecem à vontade divina) à parte divina da mente. O que pode nos levar a supor que o campo de batalha seja uma representação abstrata da mente de Arjuna, e que o conflito iminente de fato seja algo pelo qual o jovem está passando internamente durante o processo de busca pelo seu Ser Real, conceito explicado por Krishna mais tarde. Ainda, o carro de Arjuna é conduzido por um cavalo branco, marca de coragem, obediência e pureza, e em sua cimeira figura um macaco, tomado como símbolo da audácia e da engenhosidade, sugerindo que Arjuna seja um homem jovem em desenvolvimento.

Arjuna vê parentes, amigos e mestres do outro lado do campo de batalha como 'inimigos', pois, considerando o campo de batalha como sua mente, estas pessoas são degraus pelos quais ele deve subir para obter o conhecimento perfeito de si mesmo.
Estátua de Arjuna em Bali, Indonesia

Ao ver Arjuna entristecido e sem forças para lutar, Krishna o diz que "o homem cheio de medo e dúvidas afasta-se por si mesmo do céu e da bem-aventurança, que é próprio à alma que conhece a verdade.". A entidade quer dissuadi-lo da ideia de desistir da batalha e encorajá-lo a lutar e vencer. Para isso, expõe uma série de argumentos filosóficos do hinduísmo (doutrina Sankya), a fim de abrir os olhos de seu interlocutor e ensiná-lo que "os sábios não se entristecem nem por causa dos vivos nem por causa dos mortos".

A conversa que se segue é reveladora. Krishna passa ensinamentos sobre a alma, que é imperecível e indiferente ao estado do corpo material que habita. E que as experiências sensoriais físicas (como prazer e dor), por estarem inexoravelmente ligadas ao corpo material (Ser Irreal), são efêmeras e irrelevantes quando comparadas a constância e eternidade da alma (Ser Real), "o homem que não se deixa mais atormentar por essas coisas, - que se conserva firme e inabalável no meio do prazer e da dor, - que possui a verdadeira igualdade de ânimo: esse, crê-me, entrou no caminho que conduz à imortalidade."

Portanto, seria presunção de Arjuna pensar que é capaz de matar alguém, já que o Ser Real é indestrutível e imperecível. Ninguém pode exterminá-lo: "Aquele que pensa, em sua ignorância: 'Eu mato' ou 'Eu serei morto', procede como criança que não tem conhecimento da verdade, porque o que É na realidade, é eterno, e o Eterno não pode matar nem ser morto. Conhece esta verdade ó príncipe! O Homem real, isto é, o Espírito do homem, não nasce nem morre. Inato, imortal, perpétuo e eterno, sempre existiu e sempre existirá. O corpo pode morrer ou ser morto e destruído; porém, aquele que ocupou o corpo, permanece depois da morte deste."

Mesmo que Arjuna tenha dificuldade ou se negue a acreditar nestas palavras, Krishna o faz refletir sobre a infalibilidade da morte: "Se, porém, não crês, e pensas que nascimento e morte são coisas reais, mesmo assim te pergunto: por que te lamentas e entristeces? Em verdade, a morte deriva do nascimento, e o nascimento decorre da morte. Não te aflijas, pois, pelo inevitável."

Por fim, Krishna ainda afirma que se Arjuna desistir da luta, ele ficará envergonhado pela desonra perante seu povo. O que, para um nobre de nascimento, é pior que a morte.

Um comentário:

  1. Olá Marcio,
    Poderia me recomendar um livro comentado do Bhagavad Gita.
    Obrigada

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